sábado, 22 de agosto de 2009

Ressurreição

Ouçam essa melodia e leiam o conto, talvez cause algum efeito, talvez tenha uma relação, talvez realce a (in)tens(ç)ão do conto. Obrigado!



Recuso-me a versar nesse papel. Será uma pseudo-prosa, indecisa, sem aqueles cuidados com o uso da boa palavra, o habitual rebuscamento, a metáfora que abre as portas ao subjetivismo, o lirismo que trás o belo. Não sei, quero apenas dizer o que estou sentindo. Se o rumo mudar, paciência! Quem disse que meus sentimentos são constantes?!
É assim que vai ser. Como eu ainda insisto num sentimento que já não deveria mais ter forças para subsistir? Basta! Deve acabar! Como se a vida não fosse um ciclo onde tudo começa e termina, eu ainda penso nela, mesmo sabendo que nossa história já aconteceu. Por que eu ainda quero que seja? Mais e mais e mais... Chega! Sabe aquele fantasma que fica escondido à espera de uma chance para agir? Ele vem para ofuscar a minha visão, já obnubilada, com seus espectros místicos de ser indecifrável. Pois é, ela o é, mesmo sem saber e querer. Será? Já não sei, tudo é confuso, difuso, obscuro. Quero a leveza de não amar!
E se não a amasse, meus pensamentos diários teriam um rumo certo, não escreveria sobre o amor, e, consecutivamente, sobre as desilusões, as desesperanças, a tristeza, o breu de uma existência na dependência de outro ser. Quero ser-me, e só! E os pensamentos noturnos, esses não seriam sonhos nostálgicos, lembranças de um tempo acabado, ou melhor, um tempo que hoje acaba comigo. Se olho uma flor, é sua face semi-rosada, se toco essa face, é sua pele que me afaga, e minhas mãos que se arrepiam de ternura; se, por acaso, a brisa é fresca e cheirosa, sinto saudades do hálito morno de sua boca em meus ouvidos, a sussurrar seus desejos de mulher; e se, ainda...
Faz frio agora... de um gris europeu. Ali no canto, quase atrás da cortina, há um garotinho agachado, trêmulo, assustado. Olha uma sombra quase sem vida tocando um piano de cauda velho, cheio de poeira. As notas são tensas, porém melodiosas. O menino, que agora verte uma lágrima em mi-bemol, sou eu; e o que ele olha é o que me torno a cada dia.
O coração não mais bate senão por uma nesga, um sopro, um lampejo de ser-se. Assim como as estrelas abrilhantam a madrugada, seu cheiro revivifica minha alma, que já flutua para não mais voltar. Habitará agora o surreal e, de lá, destilará poesia em forma de zéfiros suaves em seus ouvidos, estarei em si enquanto ser a sonata que percorre seus anseios, suas saudades, seus sonhos. E lembrará de mim, pois serei a imagem refletida no espelho, sorrindo, admirando-a. E ser-me-á, pois se unirá ao sentido extra-vital de si mesma, a luz de meus olhos.
Mas é preciso reciclar e é por isso que vou me desprendendo aos poucos, para poder voltar completo mais adiante, assim como a natureza primaveril. Sou neste instante a folha seca que paira ao vento. Mas depois verdejarei como nunca! O sol me contemplará e beijarei a bruma fresca, cantarei o hino da liberdade de meu coração. Sorrirei para os céus e agradecerei a ressurreição. Vou caindo, deslizando em movimentos de vai-e-vem. Toco o chão e já não sou. Lá do céu, ouve-se o eco de minhas preces e Deus a abençoar a minha morte.


Marco Hruschka


4 comentários:

Espaço da Língua Francesa disse...

Alguns dos papéis dos bom escritor, na minha opinião é se tornar companheiro do leitor,é fazer com que este se sinta reconhecido em um texto que não é dele, e que mesmo assim o faz sentir como se ele estivesse presente no momento da construção das frases.
Confesso que durante a leitura do seu texto não me senti só, e que até mesmo Machado caminhou comigo dizendo a seguinte frase:"Amor repelido é amor multiplicado".
Continue assim e obrigada pela companhia.

E.R

Luigi Ricciardi disse...

Elementos da natureza e das artes sempre aumentam a beleza e a força dos textos. É o que acontece em "Ressurreição". Poucos seres humanos conseguem ter a capacidade de passar por privações e crivos e saber que um dia verdejará nos campos. Todo mundo gostaria de ser o eu-lirico do texto.

Eu suma, belo!
Parabéns!

Junior disse...

Marco,
hoje é seu aniversário. Vim para uma visita em seu blog. A intensão era de lhe presentear com uma mensagem de afeto e amizade, trazendo minhas saudades e expressando minha vontade de estar novamente perto do meu primo e amigo.
Após a leitura de algumas de suas obras percebo, entretanto, que o presenteado no dia de hoje fui eu. Seus textos me parecem calmos, mas intensos. São fortes, mas singelos. Conseguem nos trazer um sentimento nobre e nostálgico, mas ao mesmo tempo despertam uma vontade imensa de realizar, de viver, de buscar mais e sempre melhor!
Assim, além de parabenizá-lo, preciso sim é agradecê-lo pelo belo presente: seu blog; que me cativou e me fará leitor contumaz de suas obras!
Um grande abraço neste seu dia! Que Deus o ilumine sempre e o conserve sempre tão especial.
Seu amigo e primo,
Junior

Camila Peliçon disse...

Como o comentário anterior, também venho agradecer por suas palavras que nos fazem voar em nossos pensamentos, simplismente brilhante...
Adoro quando escreve expressando o amor...
Nos coloca em situações vividas, nos dando um pouco de esperança, o que nos faz bem ler...
Quanto ao seu progreço, você sabe que sempre aplaudirei de pé...
Um grande abraço Marco!!!

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Maringá, Paraná, Brazil
Marco Hruschka é natural de Ivaiporã-PR, nascido em 26 de agosto de 1986. Morou toda a sua vida no norte do Paraná: passou a infância em Londrina e desde os 13 anos mora em Maringá. Sempre se interessou em escrever redações na época de colégio, mas descobriu que poderia ser escritor apenas com 21 anos. Influenciado por professores na faculdade – cursou Letras na Universidade Estadual de Maringá – começou escrevendo sonetos decassílabos heroicos, depois versos livres, contos, pensamentos e atualmente dedica-se a um novo projeto: contos eróticos. Seu primeiro poema publicado em livro (Antologia de poetas brasileiros contemporâneos – vol. 49) foi em 2008 e se chama “Carma”. De lá para cá já, entre poemas e contos, já publicou mais de 50, não apenas pela CBJE, mas também em outras antologias. Em 2010 publicou seu primeiro livro solo: “Tentação” (poemas – Editora Scortecci). Em 2014, publicou “No que você está pensando?” (Multifoco Editora), livro de pensamentos e reflexões escrito primordialmente no facebook. É professor de língua francesa e pesquisador literário.

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